quinta-feira, 31 de maio de 2012

AS SEM-RAZÕES DO AMOR por Carlos Drummond de Andrade


"Eu te amo porque te amo,
Não precisas ser amante,
e nem sempre sabes sê-lo.
Eu te amo porque te amo.
Amor é estado de graça
e com amor não se paga.


Amor é dado de graça,
é semeado no vento,
na cachoeira, no eclipse.
Amor foge a dicionários
e a regulamentos vários.


Eu te amo porque não amo
bastante ou demais a mim.
Porque amor não se troca,
não se conjuga nem se ama.
Porque amor é amor a nada,
feliz e forte em si mesmo.


Amor é primo da morte,
e da morte vencedor,
por mais que o matem (e matam)
a cada instante de amor."








 Carlos Drummond de Andrade 

segunda-feira, 21 de maio de 2012

ATITUDE por Cecília Meireles





"Minha esperança perdeu seu nome...
Fechei meu sonho, para chamá-la.
A tristeza transfigurou-me
como o luar que entra numa sala.


O último passo do destino
parará sem forma funesta, 
e a noite oscilará como um dourado sino
derramando flores de festa.


Meus olhos estarão sobre espelhos, pensando
nos caminhos que existem dentro das coisas transparentes.



E um campo de estrelas irá brotando
atrás das lembranças ardentes."




Cecília Meireles

sexta-feira, 11 de maio de 2012

SE AS COISAS FOSSEM MÃES por Sylvia Orthof




Se a lua fosse mãe, seria mãe das estrelas,
O céu seria sua casa, casa das estrelas belas.


Se a sereia fosse mãe, seria mãe dos peixinhos,
O mar seria um jardim e os barcos seus caminhos.


Se a casa fosse mãe, seria a mãe das janelas,
Conversaria com a lua sobre as crianças-estrelas,
Falaria de receitas, pastéis de vento, quindins,
Emprestaria a cozinha pra lua fazer pudins!


Se a terra fosse mãe, seria mãe das sementes,
pois mãe é tudo que abraça, acha graça e ama a gente.

arquivo smms/2012 

Se uma fada fosse mãe, seria a mãe da alegria.
Toda mãe é um pouco fada... Nossa mãe fada seria.


Se uma bruxa fosse mãe, seria mamãe gozada:
Seria a mãe das vassouras, da Família Vassourada!


Se a chaleira fosse mãe, seria a mãe da água fervida,
Faria chá e remédio para as doenças da vida.


Se a mesa fosse mãe, as filhas, sendo cadeiras,
Sentariam comportadas, teriam “boas maneiras”.


Cada mãe é diferente:
Mãe verdadeira, ou postiça, mãe-vovó, mãe titia,
Maria, Filó, Francisca, Gertrudes, Malvina, Alice,
toda mãe é como eu disse.


Dona Mamãe ralha e beija,
Erra, acerta, arruma a mesa, cozinha, escreve, trabalha fora,
Ri, esquece, lembra e chora, traz remédio e sobremesa.



Tem até pai que é “tipo-mãe”...
Esse, então, é uma beleza!”


quarta-feira, 9 de maio de 2012

MINHA MÃE por Vinicius de Moraes




Minha mãe, minha mãe, eu tenho medo
Tenho medo da vida, minha mãe.

Canta a doce cantiga que cantavas
Quando eu corria doido ao teu regaço
Com medo dos fantasmas do telhado.

Nina o meu sono cheio de inquietude
Batendo de levinho no meu braço
Que estou com muito medo, minha mãe.

Repousa a luz amiga dos teus olhos
Nos meus olhos sem luz e sem repouso
Dize à dor que me espera eternamente
Para ir embora.  Expulsa a angústia imensa
Do meu ser que não quer e que não pode

Dá-me um beijo na fonte dolorida
Que ela arde de febre, minha mãe.

Aninha-me em teu colo como outrora
Dize-me bem baixo assim: — Filho, não temas
Dorme em sossego, que tua mãe não dorme.

Dorme. Os que de há muito te esperavam
Cansados já se foram para longe.

Perto de ti está tua mãezinha
Teu irmão. que o estudo adormeceu
Tuas irmãs pisando de levinho
Para não despertar o sono teu.

Dorme, meu filho, dorme no meu peito
Sonha a felicidade. Velo eu

Minha mãe, minha mãe, eu tenho medo
Me apavora a renúncia. Dize que eu fique

Afugenta este espaço que me prende
Afugenta o infinito que me chama
                                                      Que eu estou com muito medo, minha mãe.

MORAES, VINICIUS DE.  Poesia completa e prosa. Rio de Janeiro:Nova Aguilar , 1998. pág. 186.

quarta-feira, 2 de maio de 2012

MURMÚRIO por Cecília Meireles



"Traze-me um pouco das sombras serenas
que as nuvens transportam por cima do dia!
Um pouco de sombra, apenas,
- vê que nem te peço alegria.


Traze-me um pouco da alvura dos luares
que a noite sustenta no teu coração!
A alvura, apenas, dos ares:
- vê que nem te peço ilusão.


Traze-me um pouco da tua lembrança,
aroma perdido, saudade da flor!
- Vê que nem te digo - esperança!

- Vê que nem sequer sonho - amor"

Cecília Meireles



Fonte:

http://www.jornaldepoesia.jor.br/ceciliameireles.html//
 

"Já se faz  primavera "/ Holanda /03/2012 - By Dayana Menck